Prostituição na Pandemia
- Dr. Miguel Aleixo
- 18 de abr. de 2020
- 3 min de leitura

Nem toda a população experiencia a Pandemia da mesma forma.
Para alguns, a quarentena não existe e não falamos necessariamente de profissionais de saúde que se encontram neste momento na linha da frente. As necessidades e fragilidades específicas de algumas minorias sociais podem expô-las a comportamentos de risco, nomeadamente a prostituição. Neste grupo, além da necessidade financeira das suas trabalhadoras, a busca do seu serviço em tempo de pandemia poderá ser um problema. O facto de as trabalhadoras do sexo continuarem na atividade em tempos de pandemia e de Estado de Emergência propiciará uma acrescida exposição e vulnerabilidade face às probabilidades de risco de contágio.
A OMS (Organização Mundial de Saúde) identifica o distanciamento social como uma das melhores medidas para combater o contágio viral, contudo as necessidades financeiras destas pessoas “falam mais alto” tornando-se desta forma também um grupo de risco. No nosso país, a prostituição embora seja despenalizada não é reconhecida como atividade profissional. É importante recordar que, a saúde mental e as dificuldades sociais não escolhem caras, faixas etárias, estatutos sociais.
Atualmente, milhões de trabalhadores independentes que dependem apenas dos seus próprios serviços para obter sustento encontram-se expostos a uma ansiedade mais acentuada pelas acrescidas dificuldades financeiras inerentes.
No caso das trabalhadoras do sexo, o cenário agrava-se pelo preconceito social, pelo abandono por parte da população em geral, uma vez que estas necessitam de garantir direitos básicos para o exercício da atividade e pelo enorme risco de poder contrair o vírus. Estamos a falar numa luta pela sobrevivência com a quarentena obrigatória e estas pessoas podem sofrer com a incapacidade de pagar rendas, obter alimentação adequada e outras necessidades básicas. Daí a escolha destas mulheres ser posta em causa (trabalhar e arriscar contrair o vírus ou não trabalhar e passar pelas mais variadas e graves dificuldades pessoais e familiares). É uma missão impossível que atenta em muito à saúde mental destas pessoas.
A Alemanha legalizou a prostituição há cerca de 20 anos e tem uma das legislações mais liberais da Europa. Ainda assim, apesar do apoio do governo alemão, esta pandemia e medidas de contingência causaram alguma turbulência no negócio e existem relatos de falta de apoio às profissionais do sexo. Na Holanda, ficou a descoberto a precariedade dos contratos destas profissionais que trabalham maioritariamente como “trabalhadoras independentes”. Deste modo, têm surgido movimentos de apoio através de crowdfunding, (financiamento coletivo) para se arrecadar dinheiro para a compra de alimentos e medicamentos. Por outro lado, em França e Portugal, embora a prostituição não seja considerada ilegal, ainda muitas trabalhadores do sexo, mulheres e homens, lutam pela descriminalização total, isto é, a profissão para que seja reconhecida como tantas outras - com sindicatos e regalias sociais, tais como: Segurança Social, seguro de saúde, vistos de trabalho para trabalhadores migrantes, locais de trabalho seguros, sem proxenetas e geridos pelos próprios trabalhadores sexuais).
Em Portugal, o “Movimento das Trabalhadoras do Sexo” (MTS) promoveu uma campanha de angariação de fundos a nível nacional. Este movimento refere que a campanha tem como propósito " ajudar quem foi mais afetado pela pandemia, e quem se encontra nas situações mais precárias e marginalizadas" (migrantes, transgéneros).
Em termos mundiais, existiu um aumento na procura da pornografia online. Segundo o site “Porn Hub”, ocorreu um aumento substancial na atividade da página onde se salienta que, em um dia disparou 5.7% face ao habitual. Estima-se que, aproximadamente 120 milhões de pessoas consumam diariamente os conteúdos disponíveis no site com maior incidência no período da manhã. A plataforma lançou a campanha “StayHomehub”, disponibilizando mundialmente de forma gratuita os seus conteúdos premium até ao dia 23 de abril.
Esta é uma realidade à qual não podemos fechar os olhos. Como nos podemos aperceber pelos dados apresentados no parágrafo anterior, este é um negócio com uma enorme procura. No entanto, o negócio não se faz sozinho, existem pessoas reais nas nossas cidades que são marginalizadas e estão socialmente desprotegidas e esquecidas, tornando-se mais evidente em épocas de pandemia. O sofrimento mental de quem hoje tem que decidir “entre ficar doente ou passar fome” é real e doloroso. Vários países têm já uma regulamentação clara que procura liberalizar o negócio do sexo. Ainda assim, são várias as lacunas atualmente apontadas a esses sistemas. Se os países com um sistema apresentam lacunas, como será nos países cujo sistema nem sequer as reconhece como “profissionais”? É algo que podemos e devemos refletir… pela dignidade e saúde mental de todos!
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